"You don’t have to burn books to destroy a culture. Just get people to stop reading them." - Ray Bradbury.

sábado, 18 de abril de 2009

O meu Monteiro Lobato

A Vanessa, do blog Fio de Ariadne, em parceria com a Jorge Zahar Editor, propôs uma blogagem coletiva que pretende discutir, nas palavras da própria Vanessa:
Como são feito os leitores? Como eles nascem e como são moldados? Com esta coletiva busco a resposta para a seguinte pergunta: Quem foi seu Monteiro Lobato? Houve alguém na sua vida que tenha sido incentivador de seu amor pela leitura? Qual foi o pontapé inicial da sua jornada por este mundo apaixonante que é a literatura?


Bom, quando se trata de formação moral/intelectual meu pai tem um importante papel na minha criação. Isso pode ser considerado normal (ou mesmo banal), mas alguns fatores me levam a pensar que, ao menos no meu caso, merece um destaque especial.

Meu pai era mais um filho de uma família enorme, cuja matriarca era uma índia do sertão de Alagoas, uma família pobre e numerosa comandada por um pai severo. Ele só estudou até o primário, no mais foi trabalhar na lavoura para garantir a subsistência e viver oprimido pela miséria, pela seca, e pelo próprio pai, até que, não conseguindo mais tirar o sustento da terra onde viviam, vieram para São Paulo.

Meu pai tinha tudo para ser um pai como o dele foi: severo, ausente, ignorante e chegado numa bebida. Mas não foi.

Meu pai foi o extremo oposto. Desde cedo imprimiu em seus filhos à importância de estudarem para que, segundo palavras dele, "não terminassem ignorantes como ele", e também para que "tivessem uma vida melhor".

E ele se empenhou nisso, penso que a esperança, a vontade de ver seus filhos se tornarem o que ele não conseguiu - sequer pôde - ser, foi o que o motivou tanto. Me lembro bem do primeiro gibi que ganhei dele, era do Pato Donald, a história que mais gostei se passava no Egito, reli várias vezes (não era sempre que o dinheiro sobrava e dava para comprar gibis), foi ali que comecei a gostar de ler.

Do primeiro gibi ao primeiro livro, já falei dele aqui, foi rápido, e daí em diante meu pai sempre me incentivou, perguntando o que estava lendo, e até mesmo perguntando - em tom de censura - o porque de não estar lendo.

Meu pai era um leitor voraz, da D.O.Leitura, que pegava na prefeitura daqui, até livros de bolso do tipo western ou VC Andrews, de jornal antigo até nossos cadernos de escola - que, quando passei para o colegial, sempre arrancavam dele uma exclamação de "não entendo nada do que está escrito aqui" e eu respondia que "também não entendo Mendel muito bem" . Era um hobby, como o cultivo de orquídeas.

Meu pai era assim. Um nordestino de origem e formação humilde, vida sofrida, oprimida e marcada pelo trabalho, que, mesmo assim, superando todas as expectativas ou previsões, se tornou um PAI que gostava de orquídeas.

Se devo alguma coisa a alguém é a ele, e tenho a plena consciência de que devo, muito.

Devo a educação que tenho, o curso que faço, a vida que levo. Me devo por inteiro, por tudo o que sou, embora não corresponda a um vigésimo do homem que ele foi.

*

Não seria justo deixa de citar aqui pessoas com as quais passei boa parte de meus tempos de escola: as bibliotecárias. Em especial àquela que mais exerceu a função que, para mim, devia ser a de todas as bibliotecárias: conselheiras, guia cultural e, porque não, amigas. Então fica meu muito obrigado à D. Ivonilda, com quem mantenho certo contato até hoje.

24 comentários:

Luciano A.Santos disse...

Os comentários abaixo foram postados originalmente usando o Intense Debate, que parou de funcionar em 18 de Maio de 2009, e foram reproduzidos aqui tal qual foram postados.

Luciano A.Santos disse...

Obrigado Octavio, abraços.

Marcos disse...

Temos algumas coisas em comum: o pai nordestino semi-alfabetizado, o gosto pela leitura e o bom exemplo para seguirmos. Somos dois caras de sorte.

Marcelo Moraes disse...

Que legal, Luciano. Meus pais não tiveram uma vida escolar completa e tampouco condições de me estimular à leitura. Mas os momentos que eles me propiciaram na infância, foi como se eu fosse um protagonista de cada história que, posteriormente, passei a ler.

Parabéns pelo post!
Abraço.

Susana Falhas disse...

Luciano: Os nossos pais, independentem ente da escolaridade, têm sempre uma lição de vida para nos ensinar.
Parabéns pelo post! É uma bela homenagem ao teu pai! Ele deve estar orgulhoso com o filho que tem!

Até uma próxima blogagem!
Abraço, Susana

Luciano A.Santos disse...

Com certeza somos, Marcos.

Cláudia M. Belhassof disse...

Olá, Luciano!
Que história linda e comovente! Parabéns!
Estou adorando conhecer outros blogs por causa da blogagem coletiva de hoje. :)
Beijocas!

James P disse...

belo e comovente seu post.Meu pai é também uma pessoa de origem humilde ,daqueles que venceram na vida a custa de muito esforço.Para ele o importante foi dar uma educação de primeira classe para os quatro filhos.isso,graças a Deus ele consegiu.Parabéns pelo post.Abração.

Luciano A.Santos disse...

Oi James,

Fico feliz que tenha um pai como eu tive, realmente preocupado com a família e com o futuro de seus filhos. Obrigado pelas palavras, grande abraço.

Luciano A.Santos disse...

Fique à vontade :)

Luma Rosa disse...

Posso assinar este comentário? :)

Elaine dos Santos disse...

Oi, Luciano! td bem? o grande barato destas blogagens coletivas é esta oportunidade de interação, de "coração aberto". O seu pai é um pouco a minha mãe (já falecida), a falta de oportunidade deles fez a nossa riqueza intelectual. Eles sempre serão louvados, somos o que somos porque eles foram o que foram...feliz daquele que tem família para lembrar e agradecer. bjs.

Olavo disse...

Excelente texto

Olavo disse...

Excelente texto
Abraços

Luciano A.Santos disse...

Oi Olavo, obrigado também pela visita, abraços.

dade amorim disse...

Parabens pela postagem, Luciano, e tambem pelo bom pai que voce tem.
Um beijo e boa semana.

Luciano A.Santos disse...

Oi Dade, obrigado pela visita e pelas palavras, beijos e boa semana pra você também.

Luciano A.Santos disse...

Até pensei em fazer letras, mas acabei decidindo pela Ciência Contábil. Abraços.

Luiz Lailo disse...

Estou lendo os 8 posts que foram selecionados pela Vanessa, o seu é o primeiro da lista. Ao final farei meu comentário. Gostei imensamente da sua narrativa e do modo bonito como escreve. Por isso mesmo faço um pequeno reparo: cuidado com as crases, elas podem não existir.

Luciano A.Santos disse...

Oi Vanessa,

Fico muito feliz que meu texto esteja entre os finalistas, adorei participar desta blogagem. Agora é torcer :P

Abraços.

Luma Rosa disse...

Relendo o seu texto para a votação.

Marcos disse...

Parabéns por estar na final, Luciano. Revisitando para decidir em quem votar. Tarefa árdua.

Tempestade disse...

Luciano,
Gostei muito do seu texto e como bibliotecária terminei o texto em êxtase e muito feliz!
Belo exemplo de luta do seu pai e o amor e carinho com os quais ensinou aos filhos não tem preço jamais!
Seja o Monteiro Lobato de alguém!
Beijos Tempestuosos!

Tempestade disse...

Parabéns pela vitória!
Beijos Tempestuosos!

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